Sem contar com o período colonial, onde muitos viajantes e exploradores de língua alemã estiveram no país, o Brasil teve pelo menos três grandes períodos de imigração e colonização com imigrantes de língua alemã (1818-1830, 1845-1914 e 1914-1960), cada um com características próprias quanto a motivações, áreas de estabelecimento e atuação. Listamos 7 curiosidades que você deve saber a fase inicial.
1- A definição de “alemão” – A Alemanha só se tornou a Alemanha em 1871, quando Bismarck conseguiu reunir sob a mesma coroa os muitos países de língua comum – com exceção da Áustria. Antes disso, não existia uma nação alemã ou um Estado alemão, coeso e homogêneo. A Alemanha do início do século 19 era composta por vários Estados, dos mais diferentes tamanhos. Eles compunham a Confederação Alemã, criada após o Congresso de Viena (1815). Além da Áustria e da Prússia, haviam 33 Estados e quatro cidades-livres, em sua maioria com dialeto próprio, leis e características culturais muito diferentes. Entre os pioneiros de 1824, em São Leopoldo, havia hamburgueses, bávaros e hessianos.
Assim, a referência a “alemães” está associada ao conceito linguístico-cultural. Nos últimos anos alguns historiadores passaram a usar termos como “germânicos”, “germanidade” ou “presença teuta”, para se referir à imigração que envolveu os muitos países de língua alemã antes da formação do Império Alemão (1871), ou seja, o que se pode chamar de Alemanha moderna;
2- Houve presença de alemães no Brasil antes de 1824 – Os primeiros alemães a pisar o solo brasileiro estavam junto com a esquadra de Pedro Álvares Cabral, em abril de 1500. Eram artilheiros de uma unidade militar portuguesa que acompanhava a esquadra. São textos em alemão, inclusive, os primeiros a usar o termo “Brasil” para as terras em que Cabral havia desembarcado. Tentativas isoladas de implantação de colônias alemãs foram realizadas na Bahia, entre 1816 e 1818.
Todas, no entanto, sem alcançar o sucesso esperado. Somente depois do casamento de D. Pedro com a arquiduquesa austríaca Leopoldina de Habsburg-Lorena, a vinda de cientistas de língua alemã para a América e a independência brasileira, com a necessidade de colonos e soldados, o país finalmente deu início, de modo organizado, ao processo imigratório de populações alemãs.
Suíços de língua alemã já haviam chegado ao Rio de Janeiro, em 1819, e fundado Nova Friburgo, na região serrana do estado. Em janeiro de 1824, para lá também foram enviados os primeiros colonos de língua alemã do Brasil Independente. Em 3 de maio eles chegaram à colônia carioca, dois meses antes de São Leopoldo, no sul.
3- Houve presença alemã no Rio Grande do Sul antes do século 19 – Alguns alemães chegaram ao RS durante o século 18, de forma isolada, sem fazerem parte de um processo de povoamento. A família Schramm, que aqui ganhou as grafias “Xarão” ou “Charão”, é um exemplo. O médico Johann Adolph Schramm, de Braunschweig, casou em 1727 no Rio de Janeiro com Cecília de Sousa da Conceição, com quem teve o filho Antônio Adolfo Charão. Antônio, alferes dos Dragões em Rio Pardo, casou em Viamão, em 1758, com Joana Velosa Fontoura. Os descendentes deste casal tiveram ativa participação nas guerras e revoluções gaúchas.
Ainda do ponto de vista militar, importante personagem da história gaúcha é o general alemão J. Heinrich Böhm (1708-1783), natural de Bremen, no norte Alemanha, e comandante do exército português que retomou Rio Grande aos espanhóis em 1776. Böhm é conhecido como “o libertador do Rio Grande”.
4- São Leopoldo: o berço da Colonização Alemã no Brasil – A ideia de imigração e colonização no Brasil passava pela necessidade de criação de uma nova classe média, branca e pequena proprietária, que desenvolvesse a policultura agrícola e o artesanato, povoasse áreas de fronteira e que fosse capaz de abastecer cidades importantes. E São Leopoldo cumpriu muito bem esse papel, muito mais do que Nova Friburgo ou qualquer outra tentativa anterior. Daí que, mesmo não sendo o projeto pioneiro, é considerado o berço da colonização alemã no Brasil, justamente pelo sucesso no empreendimento, em que pesem todos os custos e dificuldades iniciais.
5- A contribuição dos alemães – Além da contribuição no desenvolvimento da agricultura (criação do minifúndio e da agricultura familiar) e na produção industrial (artesanal), o imigrante alemão teve um importante papel no processo de diversificação cultural do país, especialmente na língua, na gastronomia e na arquitetura. A presença alemã ainda consolidou no país a atuação dos protestantes (evangélicos luteranos e calvinistas, entre outros).
6- Contribuição militar – Além da criação do minifúndio, da agricultura familiar e da produção industrial, os alemães tiveram destacada atuação na área militar. O projeto de imigração do Primeiro Reinado também colaborou com a criação do Exército Imperial. Os alemães formaram dois batalhões de granadeiros (o 2º e o 3º, que protegiam a Família Imperial e cidade do Rio de Janeiro) e dois batalhões de caçadores (o 27º e 28º, que lutaram na Guerra Cisplatina e na Confederação do Equador).
7- Os colonos alemães mantinham escravos – Por lei imperial, os colonos imigrantes não poderiam comprar e manter escravos, mas os alemães adotaram a prática portuguesa sem pudor. Até mesmo os pastores, como Carl Leopold Voges (1801-1893) e Friedrich Christian Klingelhöffer (1784-1834), no RS, mantinham escravos em suas propriedades. Em Nova Friburgo, no RJ, o pastor Friedrich Sauerbronn (1784-1867) mantinha um escravo e cerca de 15% das famílias faziam o mesmo.
Rodrigo Trespach – www.rodrigotrespach.com
Muito bom o trabalho, sou descendente de alemães e é sempre uma iniciativa positiva manter viva a memória de nossos ancestrais, sua cultura e história.
Caro Sr. Rodrigo,
Estou em pesquisa já a 3 anos sobre meu antepassado Alemão, que chegou ao Brasil por volta de 1890. Ele instalou-se em Pelotas RS, e lá faleceu em 1906. Até aí tudo bem, já encontrei até a certidão de nascimento da minha tia avó que nasceu um São Lourenço do Sul.
O problema é que não consigo encontrar o nome dele em nenhuma lista de passageiros vindos da Alemanha nesta época. Ele aparece somente em uma lista, em 1899 saindo de Hamburgo, mas a está época ele já estava morando no Brasil e deve ter feito uma viagem para a Alemanha e aí retornou.
Estes dias conversando com minha irmã mais velha, que hoje tem 72 anos, ela me contou que o nosso avô, filho do imigrante, Georg Friedrich Fricke, era um mercenário! Ela conta que ele veio para o Brasil para treinar soldados,…mas mais nada. Portanto, a pergunta é: como eu consigo mais informações, tipo como ele deu entrada no Brasil, que Registro ele poderia ter? Será que consigo algo na Alemanha para tentar descobrir mais?
Desde já agradeço muito a sua atenção!
Atenciosamente,
Luciano Anderson Fricke
Tel 55981340317
Maravilha de trabalho, obrigado .
Bacana a pesquisa
Oi, Irwing, estou na mesma situação. Se você leu Saldanha Lemos deve ter notado que muitos documentos foram destruídos (principalmente os dos Caçadores). Na Alemanha eles não eram embarcados como soldados e sim como colonos ou artesãos. Sobre como pesquisa a genealogia, dê uma lida aqui http://www.rodrigotrespach.com/2016/05/31/uma-geracao-de-cada-vez/ Abs
Rodrigo, recentemente passei a pesquisar o ramo germânico da família. Há uma boa chance de meu antepassado ter pertencido aos grupos militares. Li a obra do Juvêncio, excelente – só aumentou a probabilidade, mas, mesmo com a lista existente no livro, ainda não posso afirmar. Pergunta: tens conhecimento de listas ou equivalentes, referente a saída deles na Alemanha?! Censo ou algo assim?!
Família: Kountz ou Chuntz ou Cornt ou Curst ou Cunst, variedade na grafia nos documentos católicos.
“Alemães formaram dois batalhões de granadeiros (o 2º e o 3º, que protegiam a Família Imperial e cidade do Rio de Janeiro) e dois batalhões de caçadores (o 27º e 28º, que lutaram na Guerra Cisplatina e na Confederação do Equador).”
Como era feito o registro das crianças filhos de pais protestante nascidas em 1870 na cidade de Torschenreuth que hoje se chama Tirschenreuth?
Oi Eduardo, pela posse de escravos entre as famílias de origem alemã, claro. Você pode ler a respeito, por exemplo, em J. Tschudi, “Viagem às Províncias do Rio de Janeiro e São Paulo”, entre outras fontes que tratam da colônia do RJ. Abs
Rodrigo, você faz referência a 15% de germânicos possuidores de escravos. Mas, entre os lusos, qual era esse percentual? Como isso era definido? Pelas posses das famílias? Pelo modo de produção? Muito obrigado
Interessante! Sou descendente de bisavos Zimmermann com Shramm e avós Zimmermann com Stahl.
Muito esclarecedor. Gostaria de saber se tens dados acerca de Alemães no Pará. Minha mãe afirma que sua avó era Alemã, mas não sabe dizer seu nome completo. Apenas que adotou por casamento o nome Chaves, passando a chamar-se Frida Chaves.
Sou descendente de germânicos, não necessariamente alemães, pois os Hille vieram da Áustria (Salsburgo),, os Bächtold da Suiça (Schfhauser), os Franke e Benkendorf, prussianos, vindos todos a Joinville SC, entre 1860 e 1870, portanto antes da reunificação da atual Alemanha, que ocorreu em 1971. Somos a oitava geração nascida em Joinville-SC. Resido em uma comunidade rural denominada Estrada da Ilha (Inseltrasse). Os lotes rurais foram adquiridos em 1860, conforme relatórios existentes no nosso Arquivo Histórico, e muitos deles ainda ocupados por seus descendentes, como é o meu caso. Casei com uma descente de italianos, vindos de Trento, que até 1918 pertencia ao Tirol Austríaco,
Estou escrevendo as minhas memórias de infância e eventualmente sobre a imigração alemã ( meus ancestrais vieram da Alemanha no Navio Argus e fizeram parte da Colônia de Nova Friburgo. Muito interessantes as suas colocações. Meu livro está num blog :
Cidadedosvagalumes.blogspot.com
Paulo, até a primeira metade do século XIX, as terras eram doadas, faziam parte de um projeto de criação de colônias agrícolas e da pequena indústria. Além de terras, os imigrantes ganhavam sementes, animais e isenção de impostos nos primeiros anos.
Estou procurando saber se as terras ocupadas pelos imigrantes alemães no século XIX foram doadas ou adquiridas.
Algume sabe ?
Grato
Sou de São Bento do Sul -SC de colonização alemã e polonesa. Meu trisavô Carl Friedrich Monich chegou no Brasil em Joinville em 1857. Foi o 5° prefeito de Joinville. Teve seus filhos, entre eles Richard Monich, meu bisavô, que adulto subiu a Serra Dona Francisca e se estabeleceu em São Bento do Sul. Muitas histórias. Povo de lutas e trabalho. Sem esquecer da música, alegria típica do povo germânico.Saudacoes.
Muito legal a sua iniciativa.
De forma objetiva e clara toca nos pontos fundamentais.
Parabéns!