Viagem pitoresca ao litoral gaúcho

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A aquarela acima provavelmente seja o mais antigo registro visual de Osório, no litoral gaúcho. Parte integrante do grande acervo dos Museus Castro Maya, no Rio de Janeiro, a aquarela sobre papel “Nossa Senhora da Serra” é datada como sendo de 1828 e atribuída à Debret.

O pintor parisiense Jean-Baptiste Debret (1768-1848) chegou ao Rio de Janeiro em 1816 junto com a Missão Artística Francesa. Um dos mais prolíficos artistas que esteve no Brasil, ele foi responsável por criar academia de Artes e Ofícios – mais tarde Academia Imperial de Belas Artes – tendo sido autor de centenas de pinturas e aquarelas que documentam a flora e a fauna brasileira, os povos indígenas e o dia a dia da população brasileira do começo do século 19 – trabalho que originou o livro “Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil”. Embora tenha produzido cerca de 60 gravuras da região sul do país, ainda existem dúvidas sobre sua viagem a região mais austral do Brasil. Certo apenas é que Debret não viajou junto com d. Pedro I em 1826, como algumas fontes informam. Ele não aparece em nenhuma relação de passageiros e acompanhantes da comitiva.

Se ele não esteve no sul, como acreditam alguns, como, então, Debret teria obtido informações sobre a região de Osório para pintar a pequena aquarela de 7×23 cm (no litoral, ele pintou ainda as vilas de Torres e Santo Antônio da Patrulha)? Mantendo-se sempre próximo a corte, Debret se valia de informações de viajantes que percorriam o Brasil de norte a sul, como o naturalista Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853), que passou pelo Rio Grande do Sul em 1820.

Mas as aquarelas que retratam a vida e o território gaúcho foram feitas, provavelmente, a partir de desenhos de outro viajante: o botânico prussiano Friedrich Sellow (1789-1831), a quem Debret chamava de “meu competente amigo”. Sellow permaneceu por aqui de 1823 a 1827, período que manteve contato com o diretor da colônia alemã de São Leopoldo, Johann Daniel Hillebrand (1795-1880), e fez “desenhos de cidades, paisagens, tipos, armas e utensílios”. Foi acolhido por José Fernandes Pinheiro (1774-1847), governador da província, que o transformou em professor de desenhos, em Porto Alegre. Se já não tinha feito antes, é provável que ele tenha desenhado Santo Antônio da Patrulha, Osório e Torres em abril de 1827, quando retornava a corte.

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A visão do artista foi tomada da “várzea do rio Tramandaí”, de onde se avista a vila ao pé da Serra Geral, à esquerda da tela (na foto atual, de 2008, a cidade se encontra na extrma direita). Se for mesmo baseada em desenho de Sellow, ele deve ter seguido a rota comum entre Porto Alegre e Santa Catarina para a época, parado nas margens das lagoas para visualizar o que Debret depois transformaria em aquarela. Em seguida, ele atravessou a barra do rio Tramandaí, se dirigiu a Torres e seguiu rumo ao norte. Sellow morreu afogado em Minas Gerais, em 1831.

Rodrigo Trespach

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O texto foi publicado hoje no Almanaque Gaúcho de Zero Hora. Para ler o original, clique na imagem acima. Para ler outras contribuições minhas para a Zero Hora clique nos títulos abaixo, ou, se preferir, acesse a página de Downloads:

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Por Rodrigo Trespach – www.rodrigotrespach.com

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