A crise migratória é um problema? Sim. Mas a solução está no diálogo e nas ações humanitárias. Em respeito à nossa própria história.
Em 2015, quando a onda migratória na Europa atingia o ápice, mas a entrada em massa de venezuelanos no Brasil era algo impensável, a Deutsche Welle me entrevistou – o jornalista Jean-Philip Struck intitulou a matéria de “A Europa que gerava emigrantes”. Comparei a imigração dos séculos 19 e 20 à atual. Muitos torceram o nariz. A ideia de que o europeu é um ser superior ainda é presente entre muitos de nós, tupiniquins. Embora os alemães (e outros mais) tenham, de fato, trazido significativa contribuição na formação do Brasil, seja na educação, nas ciências ou simplesmente contribuindo para a construção do colorido caleidoscópio religioso e étnico em nosso país, os motivos que os impeliram a cruzar o Atlântico são os mesmos que até hoje movem centenas de milhares de seres humanos mundo afora: fome, perseguições, guerras; crise econômica e política.
Eis, aqui, uma carta de um camponês alemão, do Palatinado, uma região pobre e origem de uma parcela considerável dos imigrantes de língua alemã chegados ao Rio Grande do Sul no início do século 19, explicando os motivos que o levaram a deixar a Europa. Poderia ter sido escrita hoje, na Venezuela, no Oriente Médio ou na África:
Há muito me convenci de que não posso mais alimentar a mim e minhas quatro crianças nesta região e estou ameaçado de ser subjugado ao bastão da mendicância nestes tempos cada vez menos favoráveis e, por fim, teria que pegá-lo. Por isso, decidi emigrar com minha mulher e quatro crianças para a América, para o Brasil.
Do Brasil, ele recebeu dinheiro para a passagem, sementes para as plantações, gado para a carne e o leite, ferramentas para o trabalho e a isenção de impostos para poder recomeçar. Contribuíram muito, é verdade, mas ganharam muito mais do que os que aqui estavam. Difícil imaginar que hoje seus descendentes acreditem que imigrantes não são seres humanos. A crise migratória é um problema? Sim. Mas a solução está no diálogo e nas ações humanitárias. Em respeito à nossa própria história.
Rodrigo Trespach
historiador, escritor, autor de dez livros
rodrigo.trespach@gmail.com
Artigo publicado em Zero Hora, 27/08/2018, p.20.
Muito bom ler tua mensagem, Eduardo. Obrigado! Assim, sei que meu objetivo foi atingido. Um abraço!
Olá Rodrigo,
Gosto muito dos seus escritos e da sua forma de análise. Sua postura é daquele que está preocupado com a objetividade dos fatos e com a busca da verdade histórica. Sua forma desapaixonada na análise histórica é louvável, pois não faz partidarismos e nem “puxa sardinha” para nenhum lado.
Parabéns!
Tenho os seus 4 livros da Série Histórias Não (ou Mal) Contadas.
Um Grande Abraço!
Eduardo H. S. Gandra
Rio de Janeiro – RJ